quinta-feira, março 07, 2013

Django tupiniquim

Quando soube que o Ministro Joaquim Barbosa assumiria o cargo de presidente do Supremo Tribunal Federal fiquei muito feliz. Afinal, só quem é negro,ou tem familiares negros sabe a dificuldade que é conquistar espaço num país racista. E se você é negro e pobre os percalços se tornam hercúleo.

Apesar da conquista de Barbosa ser um feito que deve ser comemorado por todos nós, me chamou a atenção a maneira como a mídia branca e de direita passou a enaltecer o ministro. Pra quem estudou um pouco semiótica e se dedicou a perder cinco minutos de reflexão, estava claro a intenção da mídia em construir um herói para combater quem? Os bandidos feios, sujos e malvados do mensalão. E ninguém melhor que Joaquim Barbosa para cumprir esse papel.

O “menino pobre que mudou o Brasil” na capa da reacionária Veja, tinha a trajetória clássica do herói de Campbell: pobre, filho de um pedreiro e uma mãe analfabeta, adorava ler, estudou, se empenhou, venceu por mérito próprio e agora? Era o herói que o Brasil precisava para combater a "quadrilha" petista.

O que essa mídia não contava é que Joaquim Barbosa é um destemperado. Durante o julgamento do mensalão, foram várias as ocasiões em que o ministro pesou a mão, às vezes, beirando a grosseria. Quem não se lembra do embaraçoso episódio em que ele disse ao colega Lewandowski, que deveria voltar à universidade e estudar mais. Totalmente desnecessário, mas ilustra bem a personalidade do ministro.

Pois bem, os principais acusados já foram julgados, então para que mais Joaquim Barbosa pode servir ao PIG (Partido da Mídia Golpista)? A mais nada! Nosso Django tupiniquim já cumpriu sua trajetória e pode voltar para a senzala.

Terça-feira, Barbosa deu o tiro de misericórdia na sua relação com os grandes conglomerados de nossa comunicação. O ministro mandou um repórter que trabalha para o Estadão "chafurdar no lixo". Dois dias depois, o jornal solta editorial intitulado “Os barracos do STF”,no qual enumera os “deslizes” de Barbosa e afirma que o estilo do relator deve preocupar, tendo em vista que a partir de 18 de março, ele assume o cargo de presidente do STF, no lugar de Carlos Ayres Britto. “E de forma alguma é descabido perguntar se ele sabe que terá de domar o seu temperamento para conduzir o tribunal com a paciência e o comedimento demonstrados por Ayres Britto - duramente testados, aliás, nos 'barracos' que teve de acalmar no curso deste julgamento”. Não apenas diz que ele deve se portar como o branco fino que o antecedeu, como sugere que seu gênio deve ser “domado”.

Além do editorial do Estadão, Merval Pereira, Dora Kramer e Marco Aurélio Mello já haviam indicado que o destempero de Joaquim Barbosa era prejudicial ao cargo que ocupará em breve. Indico aqui o ótimo artigo do Brasil 247, “Elite começa a descobrir o monstro criado no STF”.

Agora me diga, querem ou não querem enxotar o Barbosa da casa grande? Quando eu expressei essa opinião, hoje cedo, em post do Facebook, alguém veio me dizer que sou racista. Infelizmente ironia é para poucos. O fato é que eu não sou racista, a mídia brasileira é. Quando eu cheguei por aqui, essa merda toda já existia, a única coisa que fiz foi refletir sobre ela. E nesse mundo de homem branco, heterossexual e rico, os negros só têm vez quando os brancos donos do poder deixam.

Se depender de mim, Joaquim Barbosa passará. O meio jurídico é todo polido, vossa excelência pra lá, doutor sem título pra cá. As pessoas se chocam com Barbosa porque ele foge à regra. E o que esperar de um homem negro e pobre que chegou no posto que ele chegou? Não foi baixando a cabeça que ele conseguiu. Foi peitando todo o mundo. Adoro o jeito dele, menos quando é desrespeitoso. Mas quando é ácido, ele é um espetáculo!

     
Joaquim Barbosa em ângulo descontraído

sábado, março 02, 2013

O feminismo, uma pequena visão da morte e eu...

Como bem disse Woody Allen, final de ano é perigoso porque há muitas pessoas por ai andando sem supervisão. Por supervisão, subtenda-se terapia. Sim, sou adepta. Rumo ao sétimo ano do melhor da terapia freudiana e apesar de concorda com Allen, final de ano também é pra mim um momento de introspecção para rever escolhas, caminhos.

Em dezembro, pouco antes do Natal, rompi uma amizade. Rompimentos nunca são fáceis, mas aprendi a fazer isso. O que não me serve, eu simplesmente deixo ir embora, porque até que se prove o contrário, vou passar por essa vida somente uma vez, então, por favor, seja legal comigo, pode ser sua única oportunidade. Tento fazer o mesmo com os outros.

O fato é que esse rompimento me trouxe uma série de questionamentos e constatações. A primeira delas, como eu gostaria de ter deixado o Feminismo fazer parte da minha vida antes. É claro que ele já estava lá, como na tarde em que completei dez anos e minha mãe me arrancou de cima de um muro porque “MENINAS NÃO SOBEM EM MUROS”, ela bradou. Naquela mesma tarde, eu sangrei pela primeira vez. O mundo nunca mais foi o mesmo.

Apesar disso, eu só fui militar no movimento após muito tempo e depois de, sim, ter pulado muitos muros, bem maiores do que o proibido por minha mãe. E foi disso que falei em minha primeira sessão de 2013. De como o feminismo mudou determinados comportamentos, me fez mais seletiva e de como ele teria influenciado algumas escolhas do passado com as quais eu não consegui ser mais firme, mesmo quando precisava. Questões que envolviam meu corpo, meus sentimentos, a maneira como me relacionei com algumas pessoas. Mas isso já passou, eu não tenho como fazer diferente, mas posso me tornar uma mulher melhor.

E isso passa por não aceitar comentários sexitas, mesmo que venham de pessoas que gosto muito. Menos ainda comentários preconceituosos e que demonstram nítido desprezo e ódio pelas mulheres. Pessoas dessa categoria não merecem estar ao meu lado. Porque eu simplemente não me importo com a roupa que as pessoas vestem, ou com o fato de elas tentarem parecer o que não são. Se elas e eles estão felizes, vivendo a mais dura realidade, ou a mais insana fantasia, isso não é da minha conta.

E isso tudo não me diz respeito porque a vida é muito curta. Em dezembro, um conhecido foi passear na Ilha do Mel. Eles escorregou, caiu no mar e morreu. Era uma pessoa ótima, saudável, capoeirista, fazia um trabalho lindo com a molecada. E ele simplesmente morreu. Tão jovem. Mas acho que viveu do jeito que quis o tempo que ficou por aqui. Isso não é ótimo?

No dia 10 de fevereiro, eu fui internada. Tive apendicite, uma pequena hemorragia e, mais 24 horas, ele teria supurado. Entre o susto de ter que fazer uma cirurgia de emergência, ter que tomar anestesia geral, que eu morro de medo - não sabemos se acordaremos do lado de lá ou de cá - eu me vi perguntando se eu estava vivendo a vida como queria.Sim.

Minha vida não é perfeita. Eu não conheci metade dos lugares que eu desejo, eu não fiz um mestrado, não li todos os livros que tenho na prateleira, não tive um filho e ainda não estou muito certa se quero ser mãe, eu não amei de novo da maneira que gostaria. Porém,  em muitos sentidos, eu tenho levado a vida que eu acho digna. Uma vida coerente com o que penso, o que sinto e coloco em prática. E isso se intensificou muito depois do feminismo. Não foi sempre assim, mas as escolhas que fiz no passado também fazem parte da pessoa que sou hoje. Mesmo aquelas das quais me arrependo.

Não sei o que acontece depois que a gente morre e tenho pensado muito nisso. Não dá pra fugir, não é? A morte, às vezes, é angustiante porque simplesmente não temos a menor ideia do que acontece depois, se é que acontece algo. O que importa, então? Importa seguir coroando-se rainha ou rei de si, independente do que as pessoas pensam sobre você e o tanto quanto elas podem ser cruéis. São as minhas escolhas, é simplesmente entre eu e a maneira como quero levar a vida.